terça-feira, 29 de maio de 2012

HIPOCRISIA. «Por que reparas no argueiro que está na vista do teu irmão, e não reparas na trave que está na tua própria vista? Como podes dizer ao teu irmão: “Irmão, deixa-me tirar o argueiro da tua vista”, tu que não vês a trave que está na tua? Hipócrita, tira primeiro a trave da tua vista e, então, verás para tirar o argueiro da vista do teu irmão» (Lc 6,41-42)
Jesus vai ao âmago da questão. É fácil ver que as outras pessoas têm falhas, mas muitas vezes não somos suficientemente honestos para reconhecer a falha ou a enorme trave de madeira que nos impede de ver. Jesus chama a isso hipocrisia.


Não havia nada que desagradasse mais a Jesus do que a hipocrisia. Ele amava as pessoas, mas ficava furioso frente a qualquer manifestação de hipocrisia, sobretudo nos líderes religiosos do seu tempo. «Hipócritas!», exclama Ele uma e outra vez. Este desafio não visava apenas os escribas e fariseus. A espiritualidade de Jesus desafia-nos, a todos, a olhar para nós e a reconhecer a nossa própria hipocrisia, a trave nos nossos olhos.
Ser hipócrita é fingir que somos aquilo que não somos, apresentar uma falsa imagem de nós mesmos ao mundo. Tem a ver com a falsidade da nossa vida, com as mentiras e contradições em que vivemos. Tem a ver com a nossa falta de honestidade e sinceridade, com a nossa cegueira. Se eu penso que não sou cego e
que não há trave nenhuma no meu olho, então sou duplamente cego, cego frente à minha própria cegueira (cf. Jo 9,39-41). Jesus põe-nos de sobreaviso contra a ostentação das nossas virtudes frente ao mundo, como aqueles que rezam, jejuam e dão esmola em público a fim de serem notados e admirados pelos
outros (Mt 6,1-18). Estes são hipócritas. Com que facilidade nos tornamos sepulcros branqueados (Mt 23,27). Com que facilidade as palavras da nossa boca contradizem aquilo que está no nosso coração (Mc 7,5-6). Até que ponto o nosso comportamento é exibicionista, visando apenas a nossa boa reputação ou imagem? Jesus não hesitaria em chamar a isso hipocrisia. Segundo Jesus, os que dizem que não conseguem ler os sinais dos tempos mas que sabem ler perfeitamente os sinais de como vai estar o tempo no dia seguinte, são hipócritas (Lc 12,56). Quan do gastamos o nosso tempo a analisar a performance das
nossas acções no mercado, mas ignoramos as duras realidades do nosso tempo, estamos a ser hipócritas. Quando tentamos apanhar alguém em flagrante com uma pergunta inteligente, embora fingindo estar realmente interessados na resposta, então estamos a ser hipócritas, como aqueles que fizeram a Jesus uma pergunta capciosa acerca do pagamento dos impostos (Mc 12,15). Além disso, também somos hipócritas quando criticamos as outras pessoas por fazerem as mesmas coisas que nós fazemos, como aqueles que criticavam Jesus por curar ao shabat, ao passo que eles «infringiam» o shabat soltando o seu boi ou o seu burro para levá-lo a beber água (Lc 13,15). O que está em questão aqui é a honestidade e a verdade. A hipocrisia é uma mentira gritante, uma contradição. Jesus era verda deiro, honesto, sincero e completamente transparente. Por isso o seu olhar era límpido e Ele conseguia detectar as mentiras e a falsidade do mundo que o rodeava. Por isso podia endireitar o mundo, mostrando-nos o verdadeiro mundo. O fermento ou  levedura dos fariseus era a hipocrisia e as mentiras (Lc 12,1). O fermento do Reino de Deus, que Jesus estava a propagar, era a verdade e a honestidade (Lc 13,20-21 e paral.). Nesta época, em que um dos sinais do nosso tempo é a crise de individualismo e a explosão de egoísmo, aprender a saber quem somos realmente é uma questão da máxima urgência. A fome de espiritualidade nunca poderá ser saciada se continuar a ser individualista e centrada na própria pessoa. Hoje em dia, nós sabemos tantas coisas acerca de tudo, desde as estrelas até aos átomos. Até sabemos muito mais acerca do cérebro e da psique
humana. Na maior parte dos casos, porém, não nos conhecemos a nós próprios. Continuamos a não ter perspectiva, imaginando que estamos separados do resto do universo e que somos superiores a todos os outros seres. Demasiadas vezes, como individuos, permanecemos cegos frente às nossas próprias motivações, aos nossos racionalismos, à nossa hipocrisia e à realidade do nosso verdadeiro eu. Como resultado disso, podemos dizer, num sentido muito profundo, que não sabemos absolutamente nada.
Como poderemos então aprender, com toda a honestidade, a enfrentar a verdade acerca de nós próprios?
Deus abençoe a todos!

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